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quarta-feira, 8 de junho de 2011

DAS TOURADAS E DAS GRANDES CONVICÇÕES - Carta aberta ao meu avô Poeta


… e depois, António,

eles benzer-se-ão e partirão gloriosos

para a mortandade

sem que os tenhamos podido desculpar

e agradecerão as palmas

com a consciência do ritual cumprido

e haverá crianças

- crianças como eu era quando,

ao vê-los, fugia do ecrã da televisão… -,

haverá crianças, António,

que também baterão palmas

e que crescerão embaladas

pela apoteótica matança,

abençoadas pelo deus a que eles se confiaram

e em que eu nunca acreditarei

porque, perdoa-me, António,

eu não posso, nem quero, acreditar

nesse mesmíssimo deus cruel e estúpido,

se ele for tão estúpido e tão cruel

que abençoe a ritualização da tortura…







Ou fomos nós que

sempre estivemos enganados?

Ou fomos nós que

errámos quando condenámos a raiz comum

de todas as descriminações

e de todas as atrocidades?

Ou éramos só nós que víamos,

nos olhos do touro,

a mesma inocência dos dos cristãos novos, no Paço,

dos dos negros, nos porões das naus,

dos dos judeus, em Auschwitz,

dos dos nossos amigos, nas masmorras da Pide?



Todos diferentes, todos animais,

António…



E eu, António,

eu que, hoje, como há cinquenta anos,

os sinto, os entendo

e, do mais fundo de mim,

os tento perdoar,

não consigo deixar de condenar

essa crua faceta de tantos



tantos dos que,

caminhando sobre duas patas,

acreditam que a dor é monopólio seu

e que a racionalidade

lhes confere o direito de SERem os únicos.






TODOS DIFERENTES, TODOS ANIMAIS!





Ao meu avô, António de Sousa, Poeta, tradutor, advogado, crítico literário e um daqueles seres vivos que sempre acreditaram na sensibilidade de todos os outros.



Maria João Brito de Sousa - 07-06-2011-11:41h


[against all odds, com honras de blog principal]




Ps – Perdoa-me se te arrasto o nome para o campo de uma batalha que prevejo desproporcional, dura e infindável. Por esta altura, tu, lá na tua Ilha de Sam Nunca e eu, ainda por cá, fisicamente desgastada, pouco mais poderemos emprestar para além disto; nome e versos… mas não fomos nós quem sempre acreditou na força das convicções e das palavras que as levam mundo afora?

6 comentários:

Maria Luisa Adães disse...

Lindo poeta amiga!

Sem comentários não pode ficar, tanta beleza.

Mª. Luísa

Maria João Brito de Sousa disse...

Obrigada, minha amiga!
Abraço grande!

Maria Luisa Adães disse...

Viste o google, mas não sei se leste o que explico. Tenta entender! E lê com atenção no google a minha explicação e a que
dou no prémios ao teu comentário.

Essa interrogação que fazes a ti própria, tenta explicar...

O assunto não é rigidamente humano,
daí ele ser confuso - mas é puro!

Mª. Luísa

Prof Eta disse...

Gosto de quem gosta!
Obrigado por gostar.

Maria João Brito de Sousa disse...

Olá, Prof Eta! Eu já lhe disse que achei imensa graça ao nick? Mas é que achei mesmo! Gosto muito de ver até onde alcança a humana imaginação nestas coisas de títulos e nicks... valorizo-os imenso!
Abraço grande!

Maria João Brito de Sousa disse...

Maria Luísa, vou ter de voltar ao Prémios porque já não me consigo recordar da resposta que deste ao meu comment... nem sequer do meu comment... mas eu volto lá, para ver se consigo apanhar o fio à meada...
Abraço gde!