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domingo, 29 de dezembro de 2013

SONETO A UMA LONGA, LONGA INVERNIA


(Em decassílabo heróico)



Os dias são tão curtos, camaradas…

O sol começa a pôr-se… e mal nasceu

Da escuridão que esconde as madrugadas

Que Abril tão claramente prometeu…



Mas sonha-se e das cinzas apagadas,

Lampejando qual luz que não morreu,

Já renascem mil mãos não resignadas

Que brilham mesmo quando escureceu!



As horas, companheiras sequestradas

Em celas milenares de puro breu,

Conseguem resistir, sempre acordadas,



Na busca do que nunca se rendeu

E aguardam - rubra brasa! - as gargalhadas

Que o mais justo dos sonhos defendeu!


Maria João Brito de Sousa – 29.12.2013 – 13.32h

Imagem - Tipografia  Clandestina, José Dias Coelho
(retirada da página online do jornal Avante!)



sábado, 7 de dezembro de 2013

QUATRO DÉCIMAS PARA REIVINDICAR 1% PARA A CULTURA

Juntando-me ao criativo,
Nesta ingrata condição
De, sendo erudito ou não,
Nos legar caudal tão vivo,
Tão sem sombra de aditivo,
Que se assuma inexplicado
Por mais que lido e estudado,
E que exiba, enquanto passa,
Cintilações duma graça
Que justifique o seu estado,

Deixo esta exigência; a gota
Que, ao juntar-se ao franco jorro,
Diz bem mais que o que eu discorro
Quando o jorro se me esgota,
Inteiro e quase em derrota,
Mas que, na corrente, corre
Com força que não mais morre
E que, em jacto, a perpetua
Na perspectiva mais crua
De quem sobre “estros” discorre…

Pl`o rasto de todos esses
Que ao caudal se vão juntando
Quando, sem como nem quando,
Deixam proventos, benesses,
E, contra os próprios int`resses,
A lutar contra a corrente,
Ousam dar um passo em frente
Teimando em dar corpo à voz
Que, fruto de alguns de nós,
Se faz corpo em toda a gente,

Mantenho, a cada braçada
Contra a surdez dos demais
Que sendo, ou não, virtuais,
Nada escutem, mesmo nada,
Porque vão na peugada
Dessoutras frivolidades
Que desconcertam vontades,
A certeza - mais que certa! -,
De estar a nascente aberta
À criativa ousadia
Neste rio que, dia a dia,
Nos transporta à descoberta!



Maria João Brito de Sousa – 25.11.2013 – 19.54h


terça-feira, 19 de novembro de 2013

AOS QUE SE ACENDEM NA LUTA!

(Décimas)


Aos que se acendem na luta,
Aos que se apagam na fome,
Aos que vão morrendo em nome
De uns banais filhos da puta
Que lhes roubam, da labuta,
Quanto lucro os engordou,
Lá, onde o lucro os cegou
E onde a garra do poder
Que não pára de crescer
Cruamente se fincou

Sem que os direitos de um povo
Fossem, sequer, respeitados,
Garantidos, preservados,
Tudo a bem de um “mundo novo”
Que el` condena e que eu reprovo
Na palavra e nas acções
E até nas contradições
A que el` venha a estar sujeito
Pela mão de um burro eleito
E outros tantos aldrabões,

A todos esses, a quantos
Sem descanso resistirem
Mesmo se um dia caírem
Na dureza dos quebrantos
- que serão certos e  tantos… -
Mas  que nem por isso lentos,
Possam ficar sempre atentos
Sem mudar de direcção,
Sempre opondo a voz do não
Aos subornos truculentos,

À luta dos companheiros,
Àqueles que nas “barricadas”,
Sem espingardas, nem granadas,
Que no frente a frente, inteiros,
Com a força de guerreiros,
Contra tal barbaridade
Ergam presença e vontade,
Deixo os versos que escrever!
Depois, venha o que vier,
Terei estado entre os primeiros!




Maria João Brito de Sousa – 18.11.2013 - 21.02h


Tela de Álvaro Cunhal - Imagem retirada da página do Partido Comunista Português

sábado, 16 de novembro de 2013

RAZÕES PARA UMA BOA AUSCULTAÇÃO DA MISÉRIA SOCIAL ENDÉMICA

SEIS DÉCIMAS PARA BEM AUSCULTAR E DIAGNOSTICAR AS OCULTAS CAUSAS DA POBREZA SOCIAL ENDÉMICA, SEGUNDO A BOA PRÁTICA DA MEDICINA POPULAR





Com quantas lágrimas verte,
Com quanta dor te arrebanha,
Te aborda e depois se entranha,
Vem a miséria que, ao ver-te,
Te condena, te perverte,
Faz de ti farrapo humano,
Te lança no desengano,
Te desgraça, te desdenha,
Te transforma em coisa estranha
Pr`a melhor poder perder-te!

Vem, quando menos sonhavas,
Infiltrar-se, sorrateira,
Estudando a melhor maneira
De açambarcar quanto amavas,
De negar quanto aspiravas,
De minar-te a resistência
Quando, com estranha insistência,
Te obriga a ser`s quem não queres,
Desmentindo o que disseres
Pr`a tomar-te a dianteira… 

Muito poucos voltarão
A dar-te o valor que tens,
Que ela não rouba só bens,
Muda, inteira, a condição
E, além de tirar-te o pão,
Coloca-te uma etiqueta
Das que abundam na sarjeta
Dos humanos preconceitos
Onde alguns poucos “eleitos”
Encontram fama e razão…   

Quanto mais dúbia, mais duro
Se torna o jugo que impôs
Sobre a voz da tua voz
Quando aperta, furo a furo,
O cinto com que o esconjuro
Te abraçou nesse momento
Em que, sem outro argumento,
Te afastou de quanto amaste
E logo, em claro contraste,
Te impôs seu próprio futuro  

Pois assim que essa armadilha
Por elites preparada,
Tão fatal, tão bem estudada,
Que nem a própria partilha
Bloqueia os rumos que trilha,
Se estende tão triunfante,
Como se fora gigante
De bocarra escancarada
Cravando, pela calada,
A dentuça acutilante,


E, munida de mil manhas
Bem escondidinhas na manga,
Faz, de amigo, um  seu“capanga”
Com duas ou três patranhas
De opacidades bem estranhas,
Tu, nas malhas enrededado,
Já nem sabes pr`a que lado
Te empurra essa dura canga;
Se pr`á na fome ou se pr`á “tanga”
De quem, de ti, fez “coitado”!






Maria João Brito de Sousa – 15.11.2013 – 14.47h




sexta-feira, 8 de novembro de 2013

(CON)TRASTE - Seis décimas para desafiar a mo(r)te sem glosar mote algum




Voz do comando final
Destoutra rebelião,
Mesmo que eu diga que não,
Que te erga o punho e proteste
Negando que aqui vieste
Sem bater, nem dar sinal,
Pôr fim, a bem ou a mal,
A quanto sobre à função
De ir conjugando alma e mão
Em versos que me não deste
E, decerto, não escreveste,
Mas nos quais deixaste o sal, 

De nada me servirá,
Mas… que fazer, se esta vida
Me pede pr`a ser vivida
Toda do lado de cá?
Sei que, nem boa, nem má,
Esse teu ciclo cumprindo,
Não te orgulhas de ter vindo
E, à força de tão cumprida,
Tanto te faz que eu decida
Dizer que de ti prescindo… 

Alguns chamam-te destino,
Eu, muito pelo contrário,
Dar-te-ei, de modo vário,
Um nome menos latino,
Mais simples, mais pequenino,
Em jeito de desafio
Pois, já que morro de frio,
De ti cobro o estranho erário
De mudar-te o corolário
Nas contas que aqui desfio! 

Aqui deixo, à revelia
Da vontade que nem tens,
Como se escólio de bens,
O nome que me ocorreu
Pois, nem inferno, nem céu,
Antes sal de humana origem,
Me surge em estranha vertigem
Num verso a que não convéns
Já que terminá-lo vens
Quando o sei ser muito meu, 

Ponto final que resultas
De um percurso acidentado,
Circunstância, tempo errado,
Poder no qual nunca exultas,
(Sei que as pessoas mais… “cultas”
criticarão quanto digo,
mas, “isto” nasceu comigo
e trago-o tão bem pensado,
tão sentido e tão estudado,
que ouso e desdenho um tal p`rigo!) 

Coisa comum que magoas,
Banalidade inclemente
Que arrebatas são, doente,
Gentes mesquinhas e boas,
Que, num segundo, atordoas
E noutro te retiraste
De quanta dor cá deixaste,
Só sei que fico contente
Por saber fazer-te frente
Quando te chamo “(con)traste”!



Maria João Brito de Sousa – 08.11.2013 – 14.31

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

1º PRÉMIO, NA CATEGORIA DE SONETO, DOS XXI JOGOS FLORAIS DO OUTONO - MONFORTE, 2013



(Em decassílabo heróico)

Noites Cálidas, de estio…



Quando uma noite cálida se estende,
Tão suavemente, à luz da vela acesa,
No linho já estendido sobre a mesa
E, viva, essoutra chama em nós se acende

Crescendo num fulgor que se não rende
Pois vem duma alquimia que a beleza
Concede se munida da certeza
De uma força interior que se não vende,

Então surge o poema, esse indomado,
Como filho que em nós fosse gerado
Por cópula lunar de anjo bravio

Ou beijo pressentido e tresloucado
De alguém que nos tivesse abençoado  
Com estro que emulasse ardor de estio…



Marianita Rocha (pseudónimo)


Maria João Brito de Sousa - 2013

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

SONETO AO PRODUTOR EXPLORADO II

(Em decassílabo heróico)

Sem agasalho, quando o frio lho pede,
Nem acessórios, quando necessários,
Não diz palavra em causa que não mede
Assim que os ventos “sopram” mais contrários

E se ergue o punho contra os “salafrários”,
Ou espuma as raivas que a razão concede,
É por ter mil razões contra os salários
Que só lhe compram fome e pagam sede!

Passa, invisível, sobre o dia-a-dia,
Vai, devagar, morrendo em contra-mão,
Arremedando a velha alegoria

Que, honrando a letra de uma melodia,
Em coro nasça de uma multidão
E saiba, erguida, impor-se à tirania…




Maria João Brito de Sousa – 03.09.2013 – 19.51h


Imagem do 25 de Abril de 1974 - Partido Comunista Português

sábado, 31 de agosto de 2013

PLACEBO



(Soneto em decassílabo heróico)


Morto o tempo do tempo de lutar
Se o gesto se me esgota em vãs rotinas,
Sobram-me horas amargas, pequeninas,
Que me impõem vagar sobre vagar

Teimando, muito embora, em não parar,
Se, a cada passo, enfrento guilhotinas,
Às noites torturadas por espertinas,
Seguem-se os dias em que “estou sem estar”

Porque um estranho cansaço vertical
Me vence, toma a rédea e rouba o sal
Das horas de criar seja o que for

Pr´a me lançar, vendada, ao lodaçal
Onde insisto em escrever - mas faço mal! –
Uns versos sem coragem nem valor…


 Maria João Brito de Sousa – 30.08.2013 – 13.41h

IMAGEM - Cat - Franz Marc, 1880 - 1916

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

SONETO À CONFIRMAÇÃO DE UM DIREITO



Ao martelo. À foice. Àquilo que simbolizam.

(Em decassílabo heróico, na oralidade – El(e)El(a))


El(e) trazia na mão, cobrindo um sonho,
O cabo de um martelo… e martelava,
El(a), um arco incompleto que ceifava
Tão habilmente quanto em verso o exponho

Exploração gera dor mas, se o suponho,
Bem mais forte era a dor que se apossava
Dos que da construção, da espiga ou fava,
Cobravam tão-somente um pão tristonho

Justo é nunca esquecer quanto devemos,
Do tanto que nos tiram, mas mantemos,
Àqueles que com a vida conquistaram

O direito ao tal pão que já mal vemos
Mas pelo qual sei bem que lutaremos
Como esses que tão caro o pão pagaram!  




Maria João Brito de Sousa – 07.08.2013 – 17.19h

quarta-feira, 31 de julho de 2013

SONETO DO PRODUTOR EXPLORADO

Aos operários das fábricas e aos trabalhadores de todo o tipo de serviços. Aos trabalhadores da terra e do mar. Aos operários da palavra, da voz, do gesto e da cor.
A todos os silenciados e explorados.


SONETO DO PRODUTOR EXPLORADO

(Em decassílabo heróico)


Eu que ergui, pelas veias das cidades,
Sentinelas de pedra e de aço puro,
Que conquistei, a pulso, as liberdades
E asfaltei, com suor, cada futuro,

Eu que paguei, com sangue, as veleidades
Que registei na cor de cada muro
E sigo em frente e moldo eternidades
A partir do que engendro e não descuro,

Não mais hei-de evocar forças ausentes!
Liberto o grito, preso entre os meus dentes,
Que irrompe deste barro em que me sou

E arrancarei, de mim, quantas correntes
Me prendam à mentira, ó prepotentes
Senhores do que julgais que vos não dou!



Maria João Brito de Sousa – 30.07.2013 – 18.58h



IMAGEM- "Força" , José Viana, óleo sobre tela
Imagem retirada da página  URBANO TAVARES RODRIGUES - Escritor


Nota da autora - Um soneto que nasceu... porque "tinha de ser"...