VISLUMBRES


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segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

NOS TEUS OLHOS, MIL SÓIS...

(Em decassílabo heróico)

Se o sol, nesses teus olhos se reflecte
E eles pasmos, inocentes, me procuram,
Nas pupilas, quais setas que perfuram,
Rendido, aquece o gelo e se derrete…

Cada olhar, feito sol, me compromete
Vazios e escuridões qu`inda perduram
E quantos medos restem se me curam
Nesse olhar que os desmente se os repete…

Há mil sóis nessas setas que me lanças
Em haustos de harmonia, em ternas danças
De silêncios solares, serenos, castos…

Meu terno irmão felino de olhos d`oiro
Que, em cúmplice feitiço ou doce agoiro,
Me devolves, brilhando, os dias gastos…




Maria João Brito de Sousa – 30.12.2012 – 15.11h

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

PARA TE AMAR, POEMA...


- Nenhuma montanha
será demasiado alta
para te amar, poema,
para te amar, tão só…


e decido-me a deixá-lo tombar…


Na queda se confundem
flor e pássaro,
tempo e modo,
metáfora e urgência real de não chegar ao fim


Porém,
tudo não dura mais do que a palavra
que,
num súbito recuo,
decido não deixar cair…


Salvo “in extremis”,
no segundo imediatamente anterior
ao impacto derradeiro,
devolvo-o às asas a que sempre pertenceu
e enfrento,
mais só do que nunca
porque consciente e lúcida,
o maior de todos os riscos
no suave declive das banalidades…


É tempo de dormir.
Amanhã será um novo dia
para te amar, poema, para te amar, tão só…


Maria João Brito de Sousa – Poema manuscrito a 24.12.2012 – 02.00h


Imagem - Tela da autora, "The suicide of the pink whale  and the dove I borrowed from Magritte"

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

SONETO À MINHA LOUCA, LOUCA INSPIRAÇÃO

Venho tarde e más horas porque venho
De um momento lunar que desconheces…
Sou o fio dessa teia em que te teces
Há mais do que a noção que tens de “antanho”…

Se firo, como febre ou corpo estranho,
Alheia a ser um mal de que padeces,
Desprezo o rumo ao tom das tuas preces
E confesso-te aqui quanto as desdenho!

Matéria, antimatéria… o que me importa
Se permaneço em ti, me quedo absorta
Pr` assombrar-te depois, sem mais razão,

E se, às vezes, me julgas quase morta,
Sem sequer te avisar, te arrombo a porta
Que usaste pr`a fechar-me o coração?



 Maria João Brito de Sousa – 18.12.2012 – 02.47h

sábado, 15 de dezembro de 2012

SEXTILHAS A UMA ESTIRPE PARTICULARMENTE VIRULENTA

É só um Coli, senhor,
Mas provoca uma tal dor,
Tanto ardor, tanta agonia,
Que parece um ditador
Traçando um plano invasor
Que a Merkel lhe invejaria!

Estando já pronta a cultura,
Na caixinha de Petri,
Mostrou ser estirpe sem cura,
Uma entendida em tortura
Que, acima de tudo, jura
Haver de instalar-se aqui…

Tem seu jogo arquitectado;
Dar-me conta da paciência
E ir-me às poupanças de Estado!
Em despesas de mercado
Foi um ror que, bem contado,
Cobriria outra emergência!
Nem com cefalosporinas
De terceira geração,
Benurons, chás, aspirinas,
Cortisol, balas e minas,
Mezinhas, grossas ou finas,
Ele aceita a rendição!

É só um Coli, vos juro,
Mas porque é que me não curo,
Porque é que o estranho ocupante
Não morre, redondo e duro,
Por aí, num canto escuro,
E prossegue triunfante?

Coisas deste imperialismo
Que anda pr`aí a grassar…
Ocupando um organismo,
Boicota-lhe o mecanismo
E aproveita o conformismo
Para a vida lhe sugar…
Pobres das minhas defesas!
Meu sistema imunitário
Caiu no rol das tais presas
Que nem revoltas, nem rezas,
Nem poemas, nem certezas,
Livraram de tal fadário!

Um Coli, simples, banal,
Que, em desgoverno total,
Me devassa a conjuntura
E ascende, em modo imperial,
Ao despudor infernal
De me impor tal ditadura!!!



Maria João Brito de Sousa – 09.12.2012 – 11.54h


NOTA - Este poema baseia-se numa infecção real  e sofrida, no presente, pela autora. Quaisquer semelhanças com o momento político que o nosso país, ou qualquer país europeu, atrevesse, é mera coincidência...

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

SONETO MUITO FANTASMAGÓRICO...

(Em verso de nove sílabas métricas)

Vês paredes de uns prédios já gastos…
De uma delas, de cinza tingida,
Brotam, vagos, soturnos e castos,
Mundos mil, estranhas formas de vida…

Se a magia nocturna dos astros
Lhes confere aparência fingida,
Serão barcas, sem remos, nem mastros,
Sobre um mar sem prelúdio ou saída…

Se, iludida, a memória se exalta,
Reconhece os perfis, neles confia
E quer crer no que aos olhos ressalta,

É tal qual como se almas penadas,
No silêncio dessa hora tardia,
Se apossassem das pedras… coitadas…


Maria João Brito de Sousa – 27.11.2012 – 15.58h

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

SONETO MUITO SURREAL, SÓ PARA DESCONTRAIR... OU NEM POR ISSO...


    (Em verso de nove sílabas métricas)

Trago a louca impudícia das horas
A tanger-me em violinos traídos
E a surpresa das aves canoras
Sobre arames farpados floridos!

Uso abismos sem fim como escoras
Dos mais altos castelos erguidos
Aos dilemas de amor das amoras
Que arranquei de corsários vencidos!

Conquistei terra e mar aos meus medos,
Moldei estátuas das chamas de velas,
Dediquei-me a aprender, dos penedos,

A essência, a cultura, o desnorte,
E, encontrando maleita ou sequelas,
Proporciono, ora alívio, ora… a morte!


Maria João Brito de Sousa – 26.11.2012 – 21.47h


Imagem - Tela de Oleg Shuplyak

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

PRELÚDIO PARA UM POENTE COMO OUTRO QUALQUER

Ah, soletro sonhos!
Somo-me em sílabas, silêncios e sons


Solidamente
sou e sigo sendo
síncrona, serena e solitária,
sonolenta sobre sobressaltos sonoros


sou, sem susto
sou, sem solução

sinto, sorvo e solicito essa insolvência…




Maria João Brito de Sousa – 28.11.2012 -16.44h


Brevíssimo exercício poético, em sibilantes,
em homenagem à oralidade da língua portuguesa
e, mais uma vez, contra o abominável Acordo Ortográfico


(para ilustração da tela Essência – MJBS -1999)

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

SONETO PARA UM SONHO QUE SONHEI - Em decassílabo quase heróico


Depois de uma janela, outra janela
Se abriu de par em par, nesse protesto…
Mil se abriram depois, fazendo o resto,
Assim que a voz do sonho ecoou nela!

Completo, nasce o sol, derruba a cela,
Infiltra-se-lhe a luz no duro asbesto
E, nessa convicção que ao sono empresto,
Traduz-se-me em vontade enchendo a tela…

Transmutada a janela em peito aberto,
Fosse essa luz descrita a voz roubada
À vivência de um tempo, insano, incerto,

Estaria essa vitória bem mais perto
E já se glosaria, em qualquer estrada,
Invicta, esta alegria em que eu desperto!




Maria João Brito de Sousa – 24.11.2012 – 09.39h