Sinto-te vir, mais suave do que a prece… Volteia sobre mim, Anjo Imprevisto! És o jorrar de um néctar que conquisto No culminar de um corpo que adormece!
De tudo o que na vida me acontece Sempre que o isco surge e não resisto, És bem menos provável – nisso insisto! – Do que um dia a romper, quando anoitece…
Portanto, anjo impossível que não esqueço, Adeja sobre mim quando adormeço, Conquista-me este sonho e vai-te embora!
Pois tu não sabes que eu não tenho preço, Que acordo, me reinvento e te despeço!? [meu assombro é lunar, não se demora...]
Lá longe Ecoa, indómito, O meu grito, Fonética estelar Que eu dignifico Num jogo universal que não domino
Eu desafio, Mais do que o razoável E seguro Nas letras a que já perdi a conta Das mil canções que crio e nem procuro
Tudo isto eu devo E nada mais me move Ou me norteia Senão a mesma força que promove A devoção lunar de uma alcateia
E, sobretudo, Eu sou, Como os demais, Palco e passagem Dos mil ilusionismos geniais De uma vontade só, que é divergente, Qual átomo lançado na voragem Da conquista da flor pela semente!
Atribuo o que tenho ao que não tenho… Se tudo tem um preço, este é o meu! Por mais que vos pareça injusto ou estranho, Aceitei-o da mão que mo estendeu…
É, portanto, das letras que desenho E que estendo pr`a vós, qual Prometeu, Que retiro o Maná que agora obtenho [quem não colhe da Terra, ordenha o Céu…]
Se, às vezes, sinto a falta de um conforto, Se a alma se me esgota na labuta, Se o provento não dá pr`a sustentar-me,
Tenho a compensação do tronco morto Renascendo da cinza; a própria fruta Com que havereis, depois, de consolar-me…